Romantização de criminosos no Brasil atual remete ao tratamento dado a Lampião no início do século 20
A forma como parte da população brasileira lida com figuras envolvidas em criminalidade tem chamado atenção de especialistas e revela um padrão histórico que se repete. A romantização de criminosos, percebida hoje nas redes sociais e em algumas comunidades, guarda semelhanças com a maneira como Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, foi tratado durante o período do cangaço.
Líder de um dos grupos armados mais conhecidos do país, Lampião comandou ações marcadas por assassinatos, estupros, sequestros, invasões de vilarejos, roubos e extorsões no Nordeste nas primeiras décadas do século 20. Apesar dos crimes atribuídos ao bando, parte da população da época o enxergava como uma espécie de herói popular.
De acordo com historiadores, esse comportamento estava ligado ao contexto social vivido no período: secas prolongadas, extrema pobreza, falta de presença do Estado em áreas rurais e a atuação opressiva de coronéis criaram um ambiente em que a população mais vulnerável via no cangaço uma possível forma de resistência ou justiça alternativa.
Essa combinação de medo, admiração e insatisfação com o poder público contribuiu para transformar Lampião em personagem folclórico, posteriormente eternizado em cordéis, músicas e produções audiovisuais.
Paralelo com a atualidade
Segundo especialistas em segurança pública, o fenômeno volta a aparecer em diferentes regiões do país. Criminosos contemporâneos, mesmo envolvidos em roubos, homicídios e outras práticas ilegais, acabam recebendo apoio, defesa ou até idolatria em determinados grupos sociais e no ambiente digital. Em alguns casos, chegam a ser tratados como celebridades ou símbolos de contestação ao sistema.
Para estudiosos, essa visão ocorre, em parte, pela persistência de problemas estruturais. “A desigualdade, a ausência de serviços essenciais e a sensação de abandono continuam alimentando a ideia de que certas figuras representam uma forma de enfrentamento ao Estado”, observam analistas.
Realidade jurídica permanece inalterada
Apesar da romantização, especialistas ressaltam que o enquadramento legal é claro: assim como Lampião foi um criminoso responsável por uma série de ações violentas, os indivíduos que praticam delitos hoje também são infratores perante a lei. A diferença está na construção cultural e social que transforma alguns desses nomes em símbolos, mitos ou personagens populares.
Para pesquisadores, compreender essa relação é essencial para discutir segurança pública, políticas sociais e a formação da memória coletiva no Brasil.




